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F1: O Filme (2025)

  • Foto do escritor: Helder Fernandes
    Helder Fernandes
  • 28 de jun.
  • 5 min de leitura

"Um carro de primeira… com os pneus gastos"

Por Helder A.S Fernandes – Crítica Quântica


O automobilismo é uma paixão que carrego desde a infância. Meu pai, ex-metalúrgico da Volkswagen, fez de tudo para que eu amasse os carros como ele: me dava miniaturas, colecionava almanaques, me levava para ver corridas de kart e até tentou me colocar no esporte — mas os custos altos na época impediram. No fim, herdei dele o gosto por carros (especialmente os alemães) e pelo Santos Futebol Clube. O cinema entrou depois, mas com a mesma intensidade, e acabei me formando na área. Assim como no kart, o caminho não foi fácil, mas sigo firme — e talvez por isso F1 – O Filme tenha mexido tanto comigo.


Produzido pela Apple Studios, com nomes de peso como Brad Pitt, Jerry Bruckheimer (Top Gun, Piratas do Caribe, A Rocha) e o heptacampeão Lewis Hamilton, o longa tem tudo para empolgar os fãs da Fórmula 1 e do cinema de ação. Dirigido por Joseph Kosinski (Top Gun: Maverick, Tron: O Legado) e com fotografia do premiado Claudio Miranda, o filme impressiona em sua execução técnica. O som, a trilha de Hans Zimmer, e a imersão visual colocam o espectador dentro dos cockpits — é como assistir a uma corrida na primeira fila de Mônaco.


Um show técnico, um roteiro derrapando


A história acompanha Sonny Hayes (Brad Pitt), um veterano da Fórmula 1 que retorna à categoria como piloto da fictícia equipe APX GP. Após décadas longe do paddock, e tendo abandonado o esporte por conta de um acidente fatal no passado, Hayes volta para ser mentor de Joshua Pierce (Damson Idris), um jovem promissor e extremamente inseguro. A equipe está em crise e precisa desesperadamente de resultados para evitar uma possível venda — cenário que justifica, ao menos em parte, a proposta inusitada.


A dinâmica entre Hayes e Pierce é o coração do filme — e funciona. Enquanto Hayes é um nômade marcado por derrotas e impulsos, Pierce representa a nova geração, pressionado por mídia e pela própria inexperiência. Ambos são contraditórios, perdidos e inseguros. A química entre Pitt e Idris é boa, e rende os melhores momentos do longa.


Kerry Condon também se destaca como a engenheira-chefe da equipe, uma espécie de Adrien Newey ou Mattia Binotto da ficção, administrando essa bomba-relógio que é a APX GP. Já Javier Bardem aparece como um executivo passivo, sem influência real na trama — um ator subaproveitado, repetindo o apagamento que sofreu em Duna: Parte 2.


Brad Pitt: o "quase" piloto que o roteiro insiste em mitificar


Por mais carismático que seja, Brad Pitt não convence como piloto por mérito da plausibilidade, mas porque o roteiro faz de tudo para que ele convença, à força.


Sonny Hayes não é uma lenda viva da Fórmula 1. Na verdade, ele sempre foi tratado — até por si mesmo — como um "quase". Um cara que quase venceu, quase fez história, quase construiu uma carreira de elite. Mas nunca foi além disso, travado por um temperamento explosivo e pelas circunstâncias da vida. Seu retorno não vem de conquistas, mas sim de uma amizade influente nos bastidores da equipe, o que lhe dá uma nova chance sem grandes méritos esportivos.


O filme tenta justificar essa escolha visual e comportamentalmente: fica clara a inspiração no espanhol Fernando Alonso, tanto nos maneirismos, na fala pausada e irônica, quanto no fato de ser um piloto mais velho ainda ativo e competitivo. Também há ecos de Kimi Räikkönen na frieza e no sarcasmo do personagem. Mas é impossível ignorar a discrepância: Alonso, com seus 43 anos, dois títulos mundiais, 32 vitórias e mais de 100 pódios em mais de 400 GPs, é um dos maiores nomes da história do esporte — enquanto Hayes é um ex-piloto apagado, fora da categoria há décadas, com uma carreira sem grandes feitos. A comparação soa forçada e apenas escancara o quão artificial é a tentativa de glamourizar um personagem que o próprio filme define como um fracassado.


O filme até flerta com a discussão sobre etarismo, mas não sabe desenvolvê-la. Tudo parece servir apenas como justificativa para a fantasia do retorno de Hayes, sem o peso ou a reflexão que o tema exige. Para se ter uma boa referência, basta olhar para o filme anterior de Joseph Kosinski, Top Gun: Maverick, onde a idade do protagonista é um tema dramático real, incorporado ao arco do personagem, com humanidade e melancolia genuína. Aqui, a idade de Sonny é uma muleta dramática rasa, que mal serve para explorar sua vulnerabilidade.


Pitt, apesar de ser um ótimo ator, teria sido muito mais crível em um papel técnico, nos moldes de Matt Damon em Ford vs Ferrari. Como mentor de boxes, passando experiência e tensão de bastidor, o personagem ganharia profundidade — e o filme, coerência. Mas é Brad Pitt, e alguém precisava ser o rosto vendável da produção.


Um roteiro que racionaliza o que deveria ser instintivo


Escrito por Ehren Kruger (Top Gun: Maverick), o roteiro tropeça ao tentar racionalizar e dar lógica demais a um esporte que, por natureza, é imprevisível e caótico.


A Fórmula 1 é feita de imponderáveis: acidentes, falhas mecânicas, decisões de última hora, interferência climática. Nada ali é previsível. Mas o roteiro parece desesperado por controle — tudo precisa ter justificativa, função narrativa, amarra de três atos. Isso desumaniza o esporte, transforma corridas em puzzles dramáticos, quando a graça da F1 é justamente a sensação de que qualquer coisa pode acontecer.


O filme não mostra sequer uma qualificação, reduz o fim de semana inteiro a corridas editadas como clipes de tensão pessoal, e só apresenta seu antagonista real no terceiro ato, o que deixa a história mancando boa parte do tempo.


Técnica de pole position: fotografia e trilha sonora


Se o roteiro patina, a parte técnica do filme é de pole position. A fotografia de Claudio Miranda brilha ao combinar a pompa cinematográfica com o dinamismo televisivo típico das transmissões da F1. Há uma imersão visual de tirar o fôlego, com câmeras coladas aos carros, drones voando sobre curvas fechadas e ângulos que colocam o espectador literalmente no banco do piloto.


A trilha de Hans Zimmer, fã assumido de Fórmula 1, é outro espetáculo à parte. Ela dialoga com temas clássicos da categoria, flerta com sonoridades de jogos eletrônicos e acompanha o ronco dos motores com emoção progressiva. É um trabalho orquestral que acelera a narrativa em vez de apenas ilustrá-la — e isso torna a experiência sonora tão marcante quanto a visual.


Nesses aspectos, o filme acerta como poucos. A experiência de assistir a F1 – O Filme numa sala de cinema, com som e imagem calibrados, é visceral para quem ama velocidade.



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Nota final: 8/10


Pontos fortes:


Direção envolvente e ritmo afiado


Fotografia imersiva de Claudio Miranda


Trilha sonora marcante de Hans Zimmer


Relação entre personagens principais bem construída


Parte técnica impressionante



Pontos fracos:


Roteiro pouco realista sobre o funcionamento do esporte


Uso artificial da idade do protagonista


Javier Bardem subaproveitado




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Ficha Técnica – F1: O Filme (2025)


Direção: Joseph Kosinski


Roteiro: Ehren Kruger


Produção: Brad Pitt, Jerry Bruckheimer, Lewis Hamilton, Dede Gardner, Jeremy Kleiner


Fotografia: Claudio Miranda


Trilha Sonora: Hans Zimmer


Elenco: Brad Pitt, Damson Idris, Kerry Condon, Javier Bardem, Tobias Menzies, Sarah Niles


Distribuição: Apple Studios / Warner Bros.


Duração: 125 minutos


Gênero: Ação / Drama / Esporte

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