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Pecadores (2025)

  • Foto do escritor: Helder Fernandes
    Helder Fernandes
  • 11 de jun.
  • 3 min de leitura

🎬 Pecadores (2025) – Ryan Coogler transforma o blues em resistência vampírica


Um filme de terror sobrenatural que vai além do gênero, abordando cultura, identidade e apropriação por meio da música negra americana


Por Helder A.S. Fernandes


Ryan Coogler sempre foi um cineasta inquieto, desses que desafiam o lugar-comum dos gêneros. Em sua curta, mas marcante filmografia, já visitou o drama biográfico (Fruitvale Station), o drama esportivo (Creed) e o blockbuster de super-herói (Pantera Negra e sua sequência). Mas o que une todos os seus trabalhos é a habilidade de trazer à tona questões sociais profundas, em especial as relacionadas à experiência negra nos Estados Unidos. Em Pecadores, seu novo longa, ele dá um passo ainda mais ousado: escreve, dirige e produz, abraçando a liberdade criativa total para entregar uma obra corajosa e repleta de significados.


A sinopse inicial engana. O filme parece começar como uma narrativa sobre a montagem de um clube de blues em um terreno que pertencia a um ex-membro da Ku Klux Klan. Os responsáveis pelo projeto são os irmãos gêmeos Elias “Fuligem” Moore e Ellijah “Fumaça” Moore — ambos interpretados por Michael B. Jordan, colaborador habitual de Coogler. A primeira metade se constrói de forma contemplativa, apresentando cada personagem que irá ajudar na construção do espaço. A trama se desenrola com calma, até a entrada de Remmick (Jack O’Connell), uma figura enigmática e carismática, que muda completamente o tom da história.


É aí que Pecadores revela sua verdadeira natureza: um conto de horror com forte simbolismo cultural. Remmick é um vampiro irlandês, líder de um grupo que toca músicas folclóricas e se aproxima do clube com intenções sombrias. Mas diferente dos vampiros tradicionais, esses não apenas sugam o sangue de suas vítimas — eles se apropriam de suas identidades, memórias e expressões artísticas. O vampirismo aqui é uma metáfora poderosa sobre como a indústria e a dominação branca roubaram a essência do blues, transformando-o em produto esvaziado, precursor do rock que, por sua vez, alcançou sucesso global.


O clube montado pelos irmãos Moore se torna um santuário artístico — e uma trincheira. Quando Sammie “O Pastorzinho” Moore (Miles Catton), primo dos gêmeos, começa a tocar, o filme mergulha em uma dimensão quase lúdica. A música assume papel central, sendo apresentada como uma entidade viva, que transcende o tempo. O blues, aqui, é mais que trilha: é resistência, é memória, é identidade.


A crítica se aprofunda quando o roteiro expõe como o capital e o comércio são capazes de corromper a arte. Remmick seduz com ouro, riqueza e promessas de fama — elementos que historicamente serviram para apagar o protagonismo negro de diversos movimentos culturais. Em uma sequência brilhante, vemos os sons do rock invadindo o clube enquanto ele é destruído — uma alegoria direta sobre a diluição do blues e sua substituição midiática por um produto mais “palatável” ao público branco.


O roteiro, também assinado por Coogler, é cheio de camadas e simbolismos, e certamente mereceria um ensaio só para explorar todas as suas figuras de linguagem. Mas seu impacto só é completo graças à trilha sonora magistral de Ludwig Göransson. Parceiro habitual do diretor, Göransson entrega aqui uma de suas obras mais ricas e emotivas, capturando a essência do blues e usando a música como elemento narrativo. As composições não apenas ilustram — elas comunicam, transformam e tensionam a trama.


Visualmente, o longa também impressiona. A fotografia de Autumn Durald Arkapaw alterna entre tons quentes, que remetem à alma do blues, e a frieza sobrenatural que cerca os vampiros. O figurino, assinado por Ruth E. Carter, traz uma elegância rústica e histórica, conectando visualmente passado e presente.


Pecadores é um filme raro. Consegue entreter com seu suspense e horror sobrenatural, mas também provocar com sua crítica social e homenagem à cultura negra. É sobre vampiros, mas também sobre arte. Sobre terror, mas também sobre pertencimento. É um grito estético e político, embalado por guitarras, contrabaixos e a dor ancestral de uma música que insiste em sobreviver.



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🎯 Veredito


Nota: 9/10

Coogler entrega um filme instigante e necessário, que usa o terror para resgatar memórias e combater o apagamento cultural. Pecadores é, acima de tudo, um manifesto sobre a força da arte negra.



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🎞️ Ficha técnica


Título: Pecadores (2025)


Gênero: Terror, Suspense


Direção, Roteiro e Produção: Ryan Coogler


Duração: 137 minutos


Estreia no Brasil: 17 de abril de 2025


Distribuição: Warner Bros. Pictures


Elenco principal: Michael B. Jordan, Hailee Steinfeld, Jack O'Connell, Wunmi Mosaku, Delroy Lindo


Trilha sonora: Ludwig Göransson


Fotografia: Autumn Durald Arkapaw


Figurino: Ruth E. Carter

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